

Painel de vacinas de Kennedy estreia nos EUA sob críticas por estudo inexistente
Um grupo de especialistas nomeado pelo secretário de Saúde americano, o cético das vacinas Robert Kennedy Jr., estreou, nesta quarta-feira (25), sob críticas por citar um estudo inexistente em uma apresentação.
O Comitê Consultivo sobre Práticas de Imunização (ACIP, na sigla em inglês) é um órgão-chave que aconselha a principal agência de saúde do país, os Centros para o Controle e a Prevenção de Doenças (CDC).
Recentemente, o secretário de Saúde destituiu os 17 membros deste comitê, acusando-os de conflitos de interesses financeiros, e anunciou a nomeação de novos integrantes, vários deles polêmicos, como um bioquímico contrário às vacinas.
O diretor do novo painel de especialistas é Martin Kulldorff, um dos signatários da Declaração de Great Barrington, que pedia o fim dos confinamentos em outubro de 2020, meses antes da disponibilização das vacinas contra a covid-19.
Na ordem do dia estavam as vacinas que contêm timerosal.
Este conservante à base de mercúrio, usado durante muito tempo nas vacinas, foi retirado em 1999 em resposta a preocupações da opinião pública americana, mas ainda está presente em alguns imunizantes, como os que combatem a gripe. Não foi demonstrada sua periculosidade em doses baixas.
Lyn Redwood, enfermeira e ex-diretora da Children's Health Defense, uma organização cética das vacinas, cofundada por Kennedy Jr., tinha previsto fazer uma apresentação sobre o tema na quinta-feira.
Os cientistas viram em seus slides, publicados previamente, que ela citava um trabalho de RF Berman, intitulado "Exposição neonatal a baixos níveis de timerosal: consequências de longo prazo no cérebro", de 2008.
O estudo não existe. Berman publicou um artigo naquele ano, mas este saiu em uma revista diferente e ele não encontrou provas que relacionassem o timerosal ao autismo.
A apresentação foi cancelada discretamente e substituída sem maiores explicações.
- A ciência revisitada -
Ao iniciar a reunião, Kulldorff lamentou sua demissão da universidade de Harvard por se negar a se vacinar contra a covid-19.
Ele também anunciou a criação de um novo grupo de trabalho para reexaminar a conveniência de imunizar bebês contra a hepatite B "no dia do nascimento".
Os especialistas receberam o anúncio com ceticismo. "A justificativa da vacinação contra a hepatite B antes da alta hospitalar [não no dia do nascimento] para os recém-nascidos é bem documentada e estabelecida, mas é outra das causas favoritas do movimento antivacina, portanto não surpreende que seja mencionada", disse à AFP Amesh Adalja, especialista em doenças infecciosas da Universidade Johns Hopkins.
"Um estudo depois do outro demonstraram que o etilmercúrio destas vacinas nunca contribuiu de forma importante para a carga de mercúrio a que estamos expostos vivendo neste planeta", disse à AFP o especialista em vacinas Paul Offit, do hospital infantil da Filadélfia.
Mesmo assim, as fabricantes concordaram em eliminá-lo das vacinas pediátricas em 1999, em resposta à preocupação da opinião pública. A substância segue presente em algumas vacinas antigripais.
- Surto de sarampo -
No caso das vacinas infantis, os pais americanos podem optar entre uma combinada contra sarampo, caxumba, rubéola e varicela (catapora), também conhecida como tetra viral (MMRV), e duas injeções em separado, uma da tríplice viral (MMR — sarampo, caxumba e rubéola) e outra contra a catapora.
A combinação poupa as crianças de tomarem uma injeção adicional, mas traz um risco levemente maior de convulsões febris, um efeito colateral pouco frequente e normalmente inofensivo.
A separação das vacinas jé é recomendada para a primeira dose entre os 12 e os 47 meses, e por isso os especialistas se perguntam o porquê de voltar a se discutir o tema.
O grupo de trabalho também poderia analisar novas pesquisas sobre o momento ótimo para administrar a vacina tríplice viral a fim de resolver as objeções religiosas de alguns pais, disse Kulldorff.
Os Estados Unidos, que declararam o sarampo eliminado no ano 2000, vivem atualmente seu pior surto em décadas, com mais de 1.200 casos e três mortes confirmadas.
As recomendações do grupo de especialistas poderiam ter consequências importantes, como a obrigatoriedade das vacinas nas escolas e a cobertura dos seguros de saúde.
J.Schmidt--BVZ